Esporte Educacional e benefícios para a saúde mental dos participantes

Inúmeras pesquisas brasileiras e ao redor do mundo demonstram os benefícios do esporte e da atividade física para a saúde mental. 

O IEE, há mais de 20 anos, trabalha com a metodologia do esporte educacional, que envolve, além do conteúdo educativo, também a prática regular de esportes por todos os estudantes matriculados. 

A metodologia do IEE visa principalmente o desenvolvimento para cidadania e educação integral das crianças e adolescentes. Mas, neste texto queremos lembrar que também estamos alinhados aos objetivos da Organização Mundial da Saúde (OMS), que  fornece diretrizes e recomendações sobre atividade física, destacando seus benefícios para a saúde e a importância de incorporá-la na rotina diária.

Durante as aulas regulares promovidas pelo IEE, crianças, jovens e adultos movimentam o corpo, a mente e as emoções, promovendo inúmeros benefícios como:

Redução do estresse e ansiedade: Vários estudos têm demonstrado que a prática regular de esportes pode reduzir os níveis de estresse e ansiedade. O exercício físico promove a liberação de endorfinas, neurotransmissores que ajudam a aliviar o estresse e melhorar o humor.

Melhora do humor e da autoestima: Participar de atividades esportivas pode aumentar os níveis de dopamina e serotonina no cérebro, neurotransmissores associados ao humor e à sensação de bem-estar. Além disso, a realização de metas pessoais e a superação de desafios no esporte podem aumentar a autoestima e a confiança.

Aumento da resiliência mental: O esporte envolve lidar com fracassos e adversidades, o que pode fortalecer a resiliência mental. Aprender a lidar com derrotas, a se adaptar a situações adversas e a persistir diante de desafios contribui para o desenvolvimento de habilidades de enfrentamento.

Melhora da qualidade do sono: A prática regular de atividades esportivas está associada a uma melhor qualidade do sono. O exercício físico pode ajudar a regular os padrões de sono, facilitando o sono profundo e reparador.

Redução do risco de depressão: Estudos mostram que indivíduos que praticam atividade física regularmente têm menor probabilidade de desenvolver depressão. O exercício ajuda a regular os níveis de neurotransmissores no cérebro e promove mudanças positivas na estrutura e na função do cérebro, que estão associadas a uma menor incidência de depressão.

Promoção da saúde cognitiva: O exercício físico regular está relacionado a melhorias na função cognitiva, incluindo memória, concentração e função executiva. Além disso, o esporte pode reduzir o risco de declínio cognitivo relacionado à idade e doenças neurodegenerativas, como o Alzheimer.

Levantamos e citaremos abaixo resumos de alguns estudos científicos recentes sobre os benefícios do esporte e atividade física para a saúde mental:

  1. Estudo sobre Exercício e Depressão (2023)
    • Referência: JAMA Network Open
    • Resumo: Uma meta-análise de 30 estudos com mais de 2.000 participantes revelou que o exercício físico regular reduz significativamente os sintomas de depressão maior. Os pesquisadores observaram que tanto atividades aeróbicas quanto de resistência são eficazes, com a maior eficácia sendo associada a exercícios de intensidade moderada a alta. O estudo conclui que a incorporação de exercícios físicos em tratamentos para depressão pode ser uma estratégia valiosa para melhorar o bem-estar emocional.
  2. Exercício e Ansiedade: Uma Revisão Sistemática (2022)
    • Referência: Anxiety, Stress, & Coping
    • Resumo: Esta revisão sistemática analisou 25 estudos sobre a relação entre exercício físico e sintomas de ansiedade. Os resultados indicaram que a prática regular de exercícios pode levar a uma redução significativa na ansiedade. Exercícios de resistência e atividades de grupo foram particularmente eficazes, mostrando que a consistência e o tipo de exercício podem influenciar os resultados. A revisão sugere que o exercício deve ser considerado uma terapia complementar para a ansiedade.
  3. Impacto do Exercício na Função Cognitiva em Adultos Mais Velhos (2023)
    • Referência: Neurology
    • Resumo: Um estudo longitudinal com 1.200 adultos mais velhos investigou como a atividade física afeta a função cognitiva. Os resultados mostraram que aqueles que participaram de atividades físicas regulares apresentaram uma menor taxa de declínio cognitivo em comparação com aqueles que eram sedentários. O estudo destaca que exercícios aeróbicos e de força melhoram a memória e a capacidade de processamento cognitivo, sugerindo benefícios substanciais para a saúde mental e cognitiva em envelhecimento.
  4. Efeitos do Exercício na Qualidade do Sono e Saúde Mental (2024)
    • Referência: Sleep Medicine Reviews
    • Resumo: Um estudo recente focou na relação entre exercício físico, qualidade do sono e saúde mental. A pesquisa demonstrou que a prática regular de exercícios está associada a melhorias na qualidade do sono, o que, por sua vez, contribui para uma saúde mental melhorada. A atividade física foi mostrada para reduzir insônia e melhorar o sono reparador, o que é crucial para o equilíbrio emocional e psicológico.
  5. Exercício e Bem-Estar Emocional em Populações de Risco (2023)
    • Referência: Journal of Affective Disorders
    • Resumo: Um estudo com indivíduos em risco de desenvolver transtornos mentais investigou como a prática de exercício físico afeta o bem-estar emocional. Os resultados indicaram que o exercício não só melhora o humor e reduz sintomas de depressão e ansiedade, mas também oferece um efeito protetor contra o desenvolvimento de transtornos mentais em populações vulneráveis. O estudo sugere que programas de exercício estruturados podem ser uma intervenção eficaz para promover a saúde mental em grupos de risco.

Esses estudos destacam o papel importante que a atividade física regular desempenha na promoção da saúde mental e enfatizam a necessidade de incorporá-la em estratégias de tratamento e prevenção para uma melhor saúde emocional e psicológica.

Além desses estudos, levantamos alguns depoimentos de familiares, alunos e professores que relatam suas percepções sobre saúde mental a partir das práticas regulares de esporte nas aulas do IEE:

“O João participa do projeto há aproximadamente cinco meses e ele não praticava nenhum esporte, só queria ficar no quarto jogando videogame. Agora, quando ele não está na aula, pega a bola de vôlei dele e vai para a rua jogar com os amigos. O pai dele e eu temos o costume de acompanhá-lo nas aulas, e achamos muito importante estar presente nesses momentos, pois é um incentivo para ele continuar na prática de esporte.” Sueli Batista Leal, mãe do João Batista, 15 anos

“Sou primeiramente muito grata pelo projeto, pelas aulas de esporte, pois foi assim que meus filhos melhoraram muito em relação aos seus comportamentos. Minhas duas filhas sofreram traumas terríveis de abuso físico e psicológico, e com a entrada delas no projeto, houve uma melhora muito grande. Hoje estão totalmente integradas, participativas e muito felizes dentro do projeto. Já meu filho João Pedro, que só ficava na rua, hoje participa de todas as ações no projeto e a rotina dele é de casa pro projeto, do projeto pra casa. Então, só tenho a dizer que o projeto de esporte mudou a rotina das minhas crianças e o que sinto nesse exato momento é gratidão.” Patricia Gomes, mãe de 3 alunos do projeto

“Desde que entrei no projeto tive uma melhora significativamente grande no vôlei pelas atividades que os professores passam. Consegui melhorar minha saúde mental e física jogando e me sinto bem melhor agora.” Aluna Sofia Possato, 15 anos

“O projeto me ajudou muito, tanto no meu desenvolvimento no vôlei, quanto no meu desenvolvimento pessoal. Eu evoluí muito em diversos fundamentos do esporte e, também, aprendi a trabalhar mais em equipe, ser mais paciente e ser muito mais unida com o meu time. Os professores sempre foram super atenciosos com a gente, sempre nos dando todo apoio necessário, independentemente do resultado dos jogos ou até de campeonatos. Dentro das aulas eu também fiz diversos amigos, que assim como os professores, sempre estavam me ajudando, me dando dicas e me incentivando a sempre melhorar.” Aluna Amanda Pereira Lacerda, 17 anos

“O esporte sempre fez parte da minha vida e sempre me fez sentir muito bem, tanto fisicamente como emocionalmente. E praticar vôlei no núcleo CEU Casa Blanca desde os meus 9 anos fez com que sempre tivesse inúmeras experiências maravilhosas e convivências com pessoas ainda melhores, além de possibilitar momentos com muitas risadas e comemorações. Por esses e outros motivos que me sinto realizado em praticar esse esporte até hoje e pretendo continuar ainda mais ao longo dos anos, pois sempre tive certeza que o esporte salva vidas e é uma verdadeira forma de se expressar.” Aluno Davi Ferreira, 18 anos – Turma de Jovens

A prática de esportes vai muito além dos benefícios físicos para o corpo, desempenhando um papel fundamental na construção de uma sociedade mais saudável. Ao participar de atividades esportivas, além da melhora na saúde mental e física, também criamos oportunidades para se conectar com outras pessoas, formar amizades e contribuir para um ambiente de respeito e cooperação.

O esporte pode ser uma poderosa ferramenta de socialização, oferecendo um espaço onde pessoas com diferentes habilidades e competências podem se unir em torno de um objetivo comum. Uma aula de esporte educacional, pautada nos princípios da inclusão, diversidade, autonomia, educação integral e protagonismo, promove valores essenciais como trabalho em equipe, disciplina e fair play, incentivando a formação de pessoas ativas e engajadas.

Ao nos integrarmos em atividades esportivas e comunitárias, fortalecemos o tecido social. O espírito de equipe e a amizade cultivados durante o esporte podem transcender o campo de jogo e influenciar positivamente na vida de todos.

Por isso, leve o esporte para a sua vida não apenas como uma prática individual, mas como uma oportunidade para se conectar, inspirar e contribuir para um mundo mais colaborativo e harmonioso. Esperamos que esse texto inspire e motive outros a se engajar  ativamente na prática de esportes e na construção de uma comunidade mais saudável e solidária.

Jogos que estimulam o pensamento crítico e criativo

Quais idéias podemos lançar para aguçar o pensamento a respeito de uma aula de esporte  educacional que possa contribuir para que os estudantes aprendam a elaborar um pensamento mais crítico e bem formulado ou seja “pensar melhor”?

Alguns leitores podem estar pensando, mas o que significa “pensar melhor”? O que isso tem a ver com jogo? Com esporte educacional? Com a roda de conversa?

Há algum tempo estudando sobre o “aprender a pensar bem” aprendi que todos podem aprimorar o pensamento, tornando-se uma pessoa cada vez mais crítica, reflexiva, autônoma e criativa. Podemos melhorar o pensamento sobre o mundo, as coisas, as pessoas e os relacionamentos. Podemos “pensar melhor” e, consequentemente, “agir melhor”, baseados em pensamentos mais bem elaborados.

Formamos os pensamentos a partir da relação que fazemos entre as informações que captamos por meio dos sentidos: olfato, paladar, visão, audição, tato e cinestésico. É através dessa relação que criamos, imaginamos, simbolizamos, memorizamos ou formamos “idéias”, conceitos, juízos, raciocínios e valores.

Podemos afirmar que “o corpo todo trabalha na produção e na construção do pensamento, mas é no cérebro que este se processa”. Quando entendemos o modo como os indivíduos aprendem a pensar e principalmente, as atividades necessárias para que o indivíduo aprenda a “pensar bem”, também vislumbramos a possibilidade e a necessidade de que essas habilidades sejam ensinadas em diferentes espaços de aprendizagem da educação formal e não formal.

São alguns exemplos de habilidades do pensar: observar, perceber, perguntar, analisar, classificar, imaginar, supor, provar, formular hipóteses, pressupor, definir, conceituar, inferir, traduzir, contextualizar, multiplicar, dividir, somar, etc.

Parece-nos que essas “ações de pensamento” podem ser realizadas por todas as pessoas, algumas com mais facilidade que outras. Entendemos também que a maior dificuldade é articular estas informações entre sí para produzir um pensamento objetivo, seguro, profundo e consistente.

Será que se misturarmos todas essas “idéias”, podemos encontrar a resposta em uma “boa aula de esporte educacional”?

Não temos uma fórmula mágica para isso, mas acreditamos que um professor que se dedique à aprendizagem dos alunos, pode planejar boas estratégias (rodas de conversa, jogos e situações problema) que contribuam para a reflexão. Trarei aqui algumas dicas pedagógicas que podem ser aproveitadas por você, professor, na hora do planejamento:

São componentes mínimos para uma boa aula de esporte educacional que contribuem para a construção do “pensar bem”:

– Professor provocativo, questionador, impaciente com o pensamento descuidado;

– Grupo de educando ávidos por se envolver num diálogo que os desafie a pensar e produzir;

É papel do professor na educação para o pensar:

– Ser árbitro e mediador do processo de discussão;

– Ser facilitador com a tarefa de estimular as crianças a raciocinarem sobre seus próprios problemas por intermédio das discussões sobre os jogos, nas rodas de conversa;

– Mostrar interesse pelos diferentes pontos de vista ou nas confirmações e contradições de opiniões particulares;

– Estimular os comentários das crianças, propiciando o desenvolvimento da discussão;

– Estar ciente de que o “diálogo” geralmente é aberto e pouco estruturado, por isso é necessário reconhecer oportunidades para que as crianças explorem novas perspectivas;

– Criar oportunidades para indicar como as idéias podem se juntar e reforçar umas as outras;

– Desenvolver o hábito de ouvir e refletir;

– Evitar “divagações”,  ou seja, organizar o pensamento a partir de um ponto concreto.

São cuidados importantes na relação com  os alunos:

– Evitar um clima de desabafo ou de vangloriar-se na auto expressão;

– Observar a relevância da discussão;

– O tempo dedicado a discussão deve ser proporcional a relevância;

– Evitar que as discussões se transformem em “sessões de bobagens”;

As discussões sobre os jogos e as rodas de conversa devem caminhar para:

– Que os estudantes sejam capazes de trocar impressões, experiências, perspectivas;

– Que os estudantes compreendam a importância de reconhecer pontos de vista das outras pessoas e apresentem bons argumentos para suas próprias opiniões;

– Que os estudantes demonstrem insatisfação com opiniões expressas de modo simples e superficial;

São pontos de observação importantes para análise de uma boa aula de esporte educacional que auxilie na construção do “pensar bem”:

– Uma aula de sucesso é aquela em que os estudantes se envolvem nos jogos e depois  em uma animada discussão que lida com uma ou outra questão da aula. Embora a discussão possa distanciar-se um pouco do tema inicial, é nessas discussões que se provocam impressões duradouras nos estudantes.

– É menos importante que as crianças lembrem-se dos fatos do que aprendam a pensar efetivamente.

– Qualquer diferença, por menor que seja, na maneira de pensar dos estudantes, pode modificar todos os seus processos de pensamento.

– A ênfase deve estar no processo de discussão e não em atingir determinada conclusão.

– Os diálogos não devem ser autoritários ou doutrinadores, devem respeitar valores de investigação e de raciocínio. 

Acredito que as dicas expostas neste texto, extraídas do pensamento de vários filósofos e sistematizadas por Matthew Lipman, só terão valor para o professor que tem em sua caixa de ferramentas um grande (?) ponto de interrogação. É preciso ter disponibilidade e compreender a “dúvida” como ponto de partida de uma educação comprometida com o “pensar bem”. O professor que questiona, reflete e aprimora o seu pensamento a cada leitura, a cada aula, é também o professor que terá alunos criativos, questionadores, que pensam e agem com autonomia e com responsabilidade. Isso porque “pensar é articular, relacionar, associar idéias ou conceitos entre sí, atribuindo assim sentido e significado para os conteúdos de aprendizagem”.

Os jogos e as rodas de conversa são ótimas estratégias para ensinar a pensar bem. Mas lembre-se de que é preciso planejar bons jogos, planejar boas perguntas sobre os jogos e pensar como irá conduzir o diálogo para que todos os alunos possam refletir sobre as suas aprendizagens, fortalecendo assim o pensamento. Afinal de contas, “o fortalecimento do pensar nas crianças deve ser uma das principais finalidades da educação esportiva e não somente uma consequência casual.”

REFERÊNCIAS:

ADRIANO R. J, CAIO, M.C, FABIO D. Práticas Pedagógicas Reflexivas, 2ed. São Paulo: Phorte, 2007

DAMASIO A. O Mistério da Consciência. tradução Laura Teixeira Motta; revisão técnica Luiz Henrique Martins Castro. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.

CHAUÍ Marilena. Convite à filosofia. São Paulo: Editora Ática, 2000. COELHO, Teixeira

EDGAR M. Os Sete Saberes Necessários a Educação do Futuro. São Paulo: Editora Cortez, 2007

FREIRE J. B. Pedagogia do Futebol. Londrina: Midiograf, 2002

FREIRE J.B. Educação como Prática Corporal. São Paulo: Editora Scipione, 2006

FREIRE P. Pedagogia da Autonomia – Saberes Necessários à Prática Educativa. 3ed. São Paulo: Editora Paz e Terra, 2007

TUBINO M. J. G. Dimensões sociais do esporte. 2ed. São Paulo/SP: Editora Cortez, 2001. 1992. 2001

MATTHEW L., ANN MS. S, FREDERICK S. O. Philosophy in the Classroom (Filosofia na Sala de Aula). Brasil/São Paulo: Editora Nova Alexandria S, 2006

Esporte Educacional e suas contribuições para uma “educação para o pensar”

Muito se discute sobre o conceito de esporte, suas dimensões sociais de rendimento, lazer, escolar e educacional.  O Instituto Esporte & Educação foca sua atuação na dimensão educacional, por esse motivo, neste texto buscaremos relatar como a metodologia do IEE incorporou a ferramenta “rodas de conversa” durante as aulas de esporte educacional e como elas podem colaborar na “educação para pensar, e pensar bem”.

Ao tratar do esporte educacional, Tubino (1992) diz que “A educação, tem um fim eminentemente social, ao compreender o esporte como manifestação educacional, tem que exigir do esporte-educação um conteúdo fundamentalmente educativo”. Dessa forma, o esporte educacional deve contribuir para formação integral, no trabalho em grupo, na tomada de decisões, na relação com ele mesmo e com os que estão a sua volta.

Com isso, vemos que se faz necessária a abordagem de um esporte que visa a formação do indivíduo crítico, reflexivo e transformador. Esporte esse que leve o educando a questionar e não se acomodar, ou seja, tornar-se autônomo em sua forma de pensar e agir.

A autonomia, segundo Freire (2003), é a capacidade de se auto governar, ou seja, a capacidade de tomar decisões com independência, contudo, sem realizar ações contrárias a vida.

Partindo destes princípios, a pergunta que segue é a seguinte: Como faríamos para que um educando tome decisões a seu favor sem prejudicar o outro?

De acordo com Freire, o educador é importantíssimo na construção da autonomia que só acontecerá se o educando a experimentar “[…]o fato de experienciar, a cada dia diversificadas situações de autonomia ensina-o a ser autônomo”.

Uma das condições para obtermos autonomia é a “tomada de consciência”, que ocorre a partir do momento que o indivíduo toma decisões levando em consideração “o bem” de todos.   

Como dissemos, o Esporte Educacional tem como objetivo promover a formação integral dos alunos se utilizarmos o esporte como ferramenta pedagógica. Essa abordagem enfatiza o desenvolvimento de habilidades cognitivas, sociais, emocionais e físicas dos indivíduos envolvidos.

O Esporte Educacional, para além das habilidades motoras oferece uma excelente oportunidade para o ensino de habilidades de pensamento crítico e resolução de problemas. Durante as atividades esportivas, os participantes precisam tomar decisões rápidas e eficazes, avaliar informações, considerar diferentes pontos de vista e trabalhar em equipe. Essas habilidades são essenciais para o sucesso acadêmico e profissional e podem ser desenvolvidas e aprimoradas por meio da prática esportiva.

Além disso, o Esporte Educacional também oferece uma oportunidade para os professores ensinarem valores importantes, como respeito, responsabilidade, solidariedade, honestidade e comprometimento. Esses valores são essenciais para a formação de cidadãos críticos, ativos e conscientes.

Em resumo, o Esporte Educacional pode ser uma excelente ferramenta para o ensino de habilidades de pensamento crítico, resolução de problemas e valores importantes para a vida dos indivíduos.

Mas como, na prática, o esporte educacional pode ensinar a pensar?

Matthew Lipman é um educador que se dedica ao estudo e ensino de habilidades de pensamento crítico e argumentação. Ele é autor de diversos livros sobre o tema, entre eles “Filosofia na sala de aula”, que aborda as estratégias e habilidades necessárias para se tornar um pensador crítico eficaz.

De acordo com Lipman, ensinar a pensar não é simplesmente transmitir informações ou conhecimentos aos alunos, mas sim ajudá-los a desenvolver habilidades de pensamento crítico que lhes permitam avaliar, analisar e questionar o mundo ao seu redor. Ele enfatiza que o objetivo do ensino de pensamento crítico é capacitar os alunos a se tornarem cidadãos ativos e responsáveis, capazes de tomar decisões informadas e participar de discussões significativas sobre questões importantes.

Para Lipman, o ensino de habilidades de pensamento crítico deve envolver a prática constante e a aplicação dessas habilidades em situações do mundo real. Ele destaca a importância de se ensinar aos alunos a fazer perguntas críticas, avaliar argumentos, reconhecer vieses e falácias, e aplicar princípios de lógica e evidência para chegar a conclusões informadas.

Além disso, Lipman também destaca a importância de se ensinar habilidades de comunicação e argumentação, para que os alunos possam expressar seus pensamentos e opiniões de forma nítida, persuasiva e fundamentada.

Em resumo, Matthew Lipman acredita que o ensino de habilidades de pensamento crítico é fundamental para capacitar os alunos a se tornarem cidadãos responsáveis e participativos, capazes de tomar decisões informadas e contribuir para uma sociedade mais justa e democrática.

                Analisando os argumentos acime, chegamos a conclusão de que “Pensar bem” é articular idéias ou informações entre si. Quando pensamos de forma fundamentada, produzimos significados e explicações, ou seja, produzimos conhecimento.  Autores como A. Damásio em seu livro “O Mistério da Consciência” e Marilena Chaui em “Convite a Filosofia”, relacionam o conhecimento diretamente ao trabalho da consciência:

O que poderia ser mais difícil de conhecer do que conhecer o modo como conhecemos? … consciência: … a percepção que um organismo tem de si mesmo e do que o cerca.” (Damásio)

Do ponto de vista da teoria do conhecimento, a consciência é uma atividade sensível e intelectual dotada do poder de análise, síntese e representação… É saber de si e saber sobre o mundo, manifestando-se como sujeito percebedor, imaginante, memorioso, falante, pensante. É o entendimento propriamente dito. (Chauí, 1995). 

Como reunir esses saberes em uma aula de esporte educacional?

No início deste texto falamos sobre a ferramenta “Rodas de Conversa”, enfatizamos que o Instituto Esporte & Educação valoriza e estimula as intervenções dos professores durante as aulas de esporte. As rodas podem acontecer no início, meio e/ou final da aula. A frequência das rodas de conversa deve se dar a partir das expectativas de ensino-aprendizagem e da necessidade de intervenções planejadas pelo educador. O mais importante é que os educandos tenham tempo equilibrado para jogar e debater, resolver os conflitos em grupo e testar no jogo o que foi discutido.

As rodas de conversa são uma ótima estratégia para promover o pensamento crítico. Nesse formato de diálogo, os alunos se reúnem em grupos para discutir tópicos específicos, regras e adaptações dos jogos, compartilhar opiniões, debater ideias e tomar decisões coletivas.

Aqui estão algumas dicas para que rodas de conversa promovam pensamento crítico e ensinem os alunos a “pensar bem”:

  • Defina o tema: O tema inicial da roda de conversa deve ter relação com o planejamento da aula, com o jogo, com o conflito que surgiu da jogada ou ainda a escolha de um tópico relevante para os alunos. É importante que o tema seja adequado ao nível de conhecimento dos alunos e que estimule a reflexão crítica. As rodas de conversa também devem ser usadas para adaptações nos jogos por meio do Sistema P-R-O-T-E-G-E. (Leia mais sobre essa ferramenta em outros textos do IEE).
  • Crie um ambiente seguro: As rodas de conversa devem ser espaços seguros e inclusivos, onde os alunos se sintam à vontade para expressar suas opiniões e ouvir as opiniões dos outros. Crie regras básicas para a conversa, como respeitar as opiniões dos outros e não interromper quando alguém estiver falando.
  • Incentive a reflexão crítica: Faça “boas perguntas” que incentivem os alunos a pensar criticamente sobre o tópico, como “Por que você acredita que isso é importante?”, “Quais são as possíveis consequências disso?” ou “Existem outros pontos de vista que devemos considerar?”.
  • Estimule o diálogo: Encoraje os alunos a ouvirem atentamente as opiniões dos outros e a responderem com perguntas e argumentos fundamentados. O objetivo é estimular um diálogo construtivo e colaborativo, onde todos possam aprender uns com os outros.
  • Encerre a conversa: Encerre a roda de conversa com uma síntese das principais ideias discutidas, com os combinados e regras organizados e faça uma reflexão final sobre o tópico. Peça aos alunos que compartilhem o que aprenderam e como podem aplicar essas ideias em suas vidas diárias.

Usando as dicas citadas, podemos considerar que as rodas de conversa são uma ótima maneira de promover o pensamento crítico e a reflexão. Ao criar um ambiente seguro e inclusivo e incentivar o diálogo e a reflexão crítica, os alunos podem desenvolver habilidades importantes para a tomada de decisões, consciência e participação cidadã. 

As rodas de conversa, bem mediadas, são uma excelente ferramenta para ensinar os alunos a “pensarem bem”, pois os estimulará a refletir sobre as atitudes, habilidades, dificuldades, regras, combinados, valores, trabalho em equipe, preconceitos, situações do jogo que refletem no cotidiano, ou qualquer tema relevante e significativo para o grupo, assuntos que os fará refletir sobre o jogo… sobre a vida.

REFERÊNCIAS:

ADRIANO R. J, CAIO, M.C, FABIO D. Práticas Pedagógicas Reflexivas, 2ed. São Paulo: Phorte, 2007

DAMASIO A. O Mistério da Consciência. tradução Laura Teixeira Motta; revisão técnica Luiz Henrique Martins Castro. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.

CHAUÍ Marilena. Convite à filosofia. São Paulo: Editora Ática, 2000. COELHO, Teixeira

EDGAR M. Os Sete Saberes Necessários a Educação do Futuro. São Paulo: Editora Cortez, 2007

FREIRE J. B. Pedagogia do Futebol. Londrina: Midiograf, 2002

FREIRE J.B. Educação como Prática Corporal. São Paulo: Editora Scipione, 2006

FREIRE P. Pedagogia da Autonomia – Saberes Necessários à Prática Educativa. 3ed. São Paulo: Editora Paz e Terra, 2007

TUBINO M. J. G. Dimensões sociais do esporte. 2ed. São Paulo/SP: Editora Cortez, 2001. 1992. 2001

MATTHEW L., ANN MS. S, FREDERICK S. O. Philosophy in the Classroom (Filosofia na Sala de Aula). Brasil/São Paulo: Editora Nova Alexandria S, 2006