Tradicionalmente, o ensino dos esportes coletivos ocorre de forma fragmentada, separando o ensino das habilidades esportivas, mais relacionadas aos aspectos físicos e motores do ensino dos sistemas táticos, que se baseiam, principalmente, nas habilidades cognitivas, socioemocionais e atitudinais. Separando os fundamentos esportivos dos jogos, das disputas das partidas, apartando os movimentos esportivos do seu contexto de realização, ou seja, com os deslocamentos, desmarcações, os adversários e tantos outros fatores. Uma das principais dificuldades dos professores de educação física e esportes é estruturar as aulas e os treinos, respeitando a totalidade e complexidade do ser humano. (DAÓLIO e MARQUES, 2003).
Durante muito tempo e, em alguns casos, até os dias atuais, a metodologia empregada para o ensino dos esportes limitou-se a considerar a justaposição das partes: condição física, mais técnica e mais força (BENDA e GRECO, 1998). A abordagem de ensino que preponderou baseou-se no pensamento mecanicista, no qual os procedimentos analíticos eram os mais apropriados para o processo de ensino e aprendizagem, inspirados “[…] no dualismo cartesiano e nos conceitos associacionistas, muito divulgados na Educação Física […]” (GRECO, 2001, p.52).
O processo de ensino e aprendizagem organizado de forma analítica ou fragmentada não é significativo para a maior parte dos aprendizes, porque as crianças e adolescentes não notam ou compreendem a necessidade e relevância das práticas de exercícios motores descontextualizados, oriundos da fragmentação das ações esportivas complexas, que envolvem ações coletivas, técnicas, táticas, capacidade físicas, emocionais e intelectuais, e que os alunos nunca vivenciaram, em razão do princípio de aprender o movimento para depois jogar o esporte, que ainda prevalece na educação física. Portanto, correm, chutam, arremessam, executam tantos movimentos sem saber qual sua funcionalidade e finalidade, contexto e função, isto é, sem significado, que se torna repetitivo, monótono e leva a desmotivação e desinteresse pela prática esportiva e consequente abandono (KIRK e MACPHAIL, 2002).
Benda e Greco (1998), Freire (1989), Garganta e Oliveira (1996) e Rossetto Junior et alii (2006) entendem que em razão da iniciação esportiva acontecer com crianças e adolescentes devem serem prazerosas, significativas e motivantes, para que gostem do esporte e tornem-se praticantes de esporte por toda sua vida.
Nesse sentido, buscar práticas pedagógicas e métodos que tornem o processo de ensino e aprendizagem esportiva mais significativos, prazeroso e motivantes é urgente para reverter o sedentarismo crescente e ampliar o número de crianças e adolescentes praticantes de esportes.
Ausubel, Novak e Hanesian, (1982), afirmam que um dos fatores determinantes à aprendizagem significativa e motivante é partir do conhecimento prévio do aluno, ou seja, iniciar o processo de ensino a partir do que o aluno já sabe. Os conhecimentos prévios são as bases em que o novo conhecimento se apoia, processo designado por “ancoragem”. Para Ausubel, Novak e Hanesian (1982) “o fator isolado mais importante que influencia a aprendizagem é aquilo que o aprendiz já sabe. Averigue isso e ensine-o de acordo”.
A Aprendizagem significativa caracteriza-se pela relação entre a informação (nova) e os aspectos relevantes (específico) na estrutura cognitiva, afetiva e ou motora do sujeito aprendiz. Aprende-se de forma significativa, quando se relaciona a nova informação (desconhecido) a outras ideias, conceitos ou conhecimentos relevantes e inclusivos, claros e disponíveis ao indivíduo, que funcionam como bases da aprendizagem (ancoragem).
A criança quando inicia no processo de aprendizagem esportiva traz como conhecimento prévio os jogos e brincadeiras vivenciados, que representam a manifestação de suas habilidades e competências (cognitivas, afetivas, emocionais e motoras), que se tornam o ponto de apoio para a ancoragem de novas informações e conhecimentos, como as habilidades, regras e táticas mais complexas do esporte. Dessa forma, a aprendizagem esportiva, para ser significativa, tem como ponto de partida os jogos e brincadeiras das crianças e não exercícios fragmentados e descontextualizados, sem pontos de “ancoragem”, especialmente, Para aqueles que nunca praticaram a modalidade esportiva.
Para iniciar o processo de ensino e aprendizagem de determinada modalidade esportiva, deve-se ativar os conhecimentos já internalizados, como as habilidades e competências inseridas e adquiridas nos jogos e brincadeiras infantis, para depois ampliá-las as esportivas, por meio de desequilíbrios dentro das possibilidades de resolução do aluno, não estando além ou aquém das suas capacidades, cognitivas, sócio afetivas e motoras. Situações problemas que desconhecem a solução, mas que conseguem resolver com a integração e cooperação entre eles, com seus conhecimentos e competências e com a colaboração do educador, possibilitando o sucesso na realização e superação do desafio da tarefa, gerando motivação para novas aprendizagens.
Para Ausubel e Robinson (apud NOVAK; GOWIN, 1999) a aprendizagem que visa o desenvolvimento integral do aluno e a educação transformadora, deve ser mais significativa possível, pois é através dela que se estabelece a construção da realidade, atribuindo significado as novas informações e conhecimentos, considerando que seus conhecimentos prévios são o fator mais importante na aprendizagem.
O jogo no processo de ensino e aprendizagem esportivo constitui-se em uma relação concreta entre o aluno (conhecimentos prévios e nível de desenvolvimento), o mundo exterior (ambiente de aprendizagem – realidade das aulas), o prazer (lúdico, que desperta o interesse e motiva a criança) e o conhecimento (cultura, especificamente, cultura corporal, o esporte), consequentemente, favorecendo a aprendizagem significativa do esporte e o desenvolvimento da criança e adolescente.
REFERÊNCIAS
Ausubel, D. P; Novak, J.D. e Hanesian, H. Psicologia educacional. Tradução para o Português, Eva Nick et al, da segunda edição de Educational psychology: a cognitive view. Rio de Janeiro: Inter-americana, 1982.
BENDA, R. N.; GRECO, P. J. (orgs). Iniciação esportiva universal: da aprendizagem motora ao treinamento técnico. Belo Horizonte: UFMG, 1998.
DAOLIO, J.; MARQUES, R.F.R. Relato de uma experiência com o ensino de futsal para crianças de 09 a 12 anos. Revista Motriz, Rio Claro, v9, n3, p169-174, set/dez, 2003.
FREIRE, J. B. Educação de corpo inteiro. Campinas, São Paulo: Scipione. 1989.
GARGANTA, J.; OLIVEIRA, J. Estratégia e táctica nos jogos desportivos colectivos. In: TAVARES, F.; OLIVEIRA, J.(orgs.). Estratégia e táctica nos jogos desportivos colectivos. Porto: FCDEF-UP, 1996. p.7-23.
GRECO, P.J. Métodos de ensino-aprendizagem-treinamento nos jogos esportivos coletivos. In: GARCIA, E.S.; LEMOS, K.L.M. (Orgs.). Temas atuais em educação física e esportes. Belo Horizonte: Saúde, 2001. v.6, p.49-72.
KIRK, D.; MACPHAIL, A. Teaching games for understanding and situated learning: rethinking the Bunker-Thorpe Model. Journal of Teaching in Physical Education, Champaign, v.21, n.2, p.177-92, 2002.
NOVAK, J. D.; GOWIN, D. B. Aprender a Aprender. Tradução para o Português, de Carla Valadares, 2ª edição. Lisboa: Plátano Edições Técnicas, 1999.
ROSSETTO JUNIOR, A.J. et alii. Jogos educativos: estrutura e organização da prática. 2.ed. São Paulo: Phorte, 2006.