Quais idéias podemos lançar para aguçar o pensamento a respeito de uma aula de esporte educacional que possa contribuir para que os estudantes aprendam a elaborar um pensamento mais crítico e bem formulado ou seja “pensar melhor”?
Alguns leitores podem estar pensando, mas o que significa “pensar melhor”? O que isso tem a ver com jogo? Com esporte educacional? Com a roda de conversa?
Há algum tempo estudando sobre o “aprender a pensar bem” aprendi que todos podem aprimorar o pensamento, tornando-se uma pessoa cada vez mais crítica, reflexiva, autônoma e criativa. Podemos melhorar o pensamento sobre o mundo, as coisas, as pessoas e os relacionamentos. Podemos “pensar melhor” e, consequentemente, “agir melhor”, baseados em pensamentos mais bem elaborados.
Formamos os pensamentos a partir da relação que fazemos entre as informações que captamos por meio dos sentidos: olfato, paladar, visão, audição, tato e cinestésico. É através dessa relação que criamos, imaginamos, simbolizamos, memorizamos ou formamos “idéias”, conceitos, juízos, raciocínios e valores.
Podemos afirmar que “o corpo todo trabalha na produção e na construção do pensamento, mas é no cérebro que este se processa”. Quando entendemos o modo como os indivíduos aprendem a pensar e principalmente, as atividades necessárias para que o indivíduo aprenda a “pensar bem”, também vislumbramos a possibilidade e a necessidade de que essas habilidades sejam ensinadas em diferentes espaços de aprendizagem da educação formal e não formal.
São alguns exemplos de habilidades do pensar: observar, perceber, perguntar, analisar, classificar, imaginar, supor, provar, formular hipóteses, pressupor, definir, conceituar, inferir, traduzir, contextualizar, multiplicar, dividir, somar, etc.
Parece-nos que essas “ações de pensamento” podem ser realizadas por todas as pessoas, algumas com mais facilidade que outras. Entendemos também que a maior dificuldade é articular estas informações entre sí para produzir um pensamento objetivo, seguro, profundo e consistente.
Será que se misturarmos todas essas “idéias”, podemos encontrar a resposta em uma “boa aula de esporte educacional”?
Não temos uma fórmula mágica para isso, mas acreditamos que um professor que se dedique à aprendizagem dos alunos, pode planejar boas estratégias (rodas de conversa, jogos e situações problema) que contribuam para a reflexão. Trarei aqui algumas dicas pedagógicas que podem ser aproveitadas por você, professor, na hora do planejamento:
São componentes mínimos para uma boa aula de esporte educacional que contribuem para a construção do “pensar bem”:
– Professor provocativo, questionador, impaciente com o pensamento descuidado;
– Grupo de educando ávidos por se envolver num diálogo que os desafie a pensar e produzir;
É papel do professor na educação para o pensar:
– Ser árbitro e mediador do processo de discussão;
– Ser facilitador com a tarefa de estimular as crianças a raciocinarem sobre seus próprios problemas por intermédio das discussões sobre os jogos, nas rodas de conversa;
– Mostrar interesse pelos diferentes pontos de vista ou nas confirmações e contradições de opiniões particulares;
– Estimular os comentários das crianças, propiciando o desenvolvimento da discussão;
– Estar ciente de que o “diálogo” geralmente é aberto e pouco estruturado, por isso é necessário reconhecer oportunidades para que as crianças explorem novas perspectivas;
– Criar oportunidades para indicar como as idéias podem se juntar e reforçar umas as outras;
– Desenvolver o hábito de ouvir e refletir;
– Evitar “divagações”, ou seja, organizar o pensamento a partir de um ponto concreto.
São cuidados importantes na relação com os alunos:
– Evitar um clima de desabafo ou de vangloriar-se na auto expressão;
– Observar a relevância da discussão;
– O tempo dedicado a discussão deve ser proporcional a relevância;
– Evitar que as discussões se transformem em “sessões de bobagens”;
As discussões sobre os jogos e as rodas de conversa devem caminhar para:
– Que os estudantes sejam capazes de trocar impressões, experiências, perspectivas;
– Que os estudantes compreendam a importância de reconhecer pontos de vista das outras pessoas e apresentem bons argumentos para suas próprias opiniões;
– Que os estudantes demonstrem insatisfação com opiniões expressas de modo simples e superficial;
São pontos de observação importantes para análise de uma boa aula de esporte educacional que auxilie na construção do “pensar bem”:
– Uma aula de sucesso é aquela em que os estudantes se envolvem nos jogos e depois em uma animada discussão que lida com uma ou outra questão da aula. Embora a discussão possa distanciar-se um pouco do tema inicial, é nessas discussões que se provocam impressões duradouras nos estudantes.
– É menos importante que as crianças lembrem-se dos fatos do que aprendam a pensar efetivamente.
– Qualquer diferença, por menor que seja, na maneira de pensar dos estudantes, pode modificar todos os seus processos de pensamento.
– A ênfase deve estar no processo de discussão e não em atingir determinada conclusão.
– Os diálogos não devem ser autoritários ou doutrinadores, devem respeitar valores de investigação e de raciocínio.
Acredito que as dicas expostas neste texto, extraídas do pensamento de vários filósofos e sistematizadas por Matthew Lipman, só terão valor para o professor que tem em sua caixa de ferramentas um grande (?) ponto de interrogação. É preciso ter disponibilidade e compreender a “dúvida” como ponto de partida de uma educação comprometida com o “pensar bem”. O professor que questiona, reflete e aprimora o seu pensamento a cada leitura, a cada aula, é também o professor que terá alunos criativos, questionadores, que pensam e agem com autonomia e com responsabilidade. Isso porque “pensar é articular, relacionar, associar idéias ou conceitos entre sí, atribuindo assim sentido e significado para os conteúdos de aprendizagem”.
Os jogos e as rodas de conversa são ótimas estratégias para ensinar a pensar bem. Mas lembre-se de que é preciso planejar bons jogos, planejar boas perguntas sobre os jogos e pensar como irá conduzir o diálogo para que todos os alunos possam refletir sobre as suas aprendizagens, fortalecendo assim o pensamento. Afinal de contas, “o fortalecimento do pensar nas crianças deve ser uma das principais finalidades da educação esportiva e não somente uma consequência casual.”
REFERÊNCIAS:
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DAMASIO A. O Mistério da Consciência. tradução Laura Teixeira Motta; revisão técnica Luiz Henrique Martins Castro. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.
CHAUÍ Marilena. Convite à filosofia. São Paulo: Editora Ática, 2000. COELHO, Teixeira
EDGAR M. Os Sete Saberes Necessários a Educação do Futuro. São Paulo: Editora Cortez, 2007
FREIRE J. B. Pedagogia do Futebol. Londrina: Midiograf, 2002
FREIRE J.B. Educação como Prática Corporal. São Paulo: Editora Scipione, 2006
FREIRE P. Pedagogia da Autonomia – Saberes Necessários à Prática Educativa. 3ed. São Paulo: Editora Paz e Terra, 2007
TUBINO M. J. G. Dimensões sociais do esporte. 2ed. São Paulo/SP: Editora Cortez, 2001. 1992. 2001
MATTHEW L., ANN MS. S, FREDERICK S. O. Philosophy in the Classroom (Filosofia na Sala de Aula). Brasil/São Paulo: Editora Nova Alexandria S, 2006